O que é a episiotomia?

A episiotomia é uma incisão cirúrgica realizada na região do períneo (entre a vulva e o ânus) com o objetivo de alargar o canal de parto durante a fase de expulsão do bebé. Durante décadas, esta prática foi ensinada como uma medida de proteção, com a intenção de prevenir lacerações graves, acelerar o parto ou proteger o bebé.

Contudo, a evidência científica atual não sustenta o uso rotineiro da episiotomia. Estudos mostram que lacerações espontâneas cicatrizam melhor, causam menos dor e têm menor risco de infeção do que as episiotomias. Além disso, a episiotomia está associada a várias complicações, incluindo dor persistente, disfunção sexual, infeções, hematomas, deiscência da sutura, lacerações extensas e, em casos raros, lesões graves.

O que diz a Organização Mundial de Saúde?

Desde 2018, a Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda de forma clara a abolição da episiotomia de rotina. A prática deve ser seletiva e apenas justificada em situações clínicas específicas. A OMS não define uma taxa ideal, mas desencoraja qualquer percentagem como referência, reforçando que a decisão deve ser individualizada, baseada em evidência e com o consentimento informado da mulher.

Qual é a realidade em Portugal?

Apesar das recomendações internacionais, a episiotomia continua a ser amplamente realizada em Portugal, com taxas significativamente acima do recomendado. De acordo com dados de 2015, mais de 70% das mulheres em trabalho de parto vaginal foram submetidas a esta intervenção — uma das taxas mais elevadas da Europa. Embora os dados mais recentes mostrem uma ligeira redução, a prática continua a ser comum, frequentemente sem consentimento informado ou indicação clínica válida.

Este cenário reflete não apenas questões técnicas, mas também uma cultura obstétrica enraizada, na qual a episiotomia é vista como uma rotina em vez de uma exceção. A formação de muitos profissionais ainda sustenta crenças ultrapassadas, como a ideia de que a episiotomia previne o prolapso de órgãos pélvicos ou protege o bebé, o que a literatura científica já refutou.

Episiotomia e direitos humanos

A episiotomia, quando realizada sem consentimento ou sem indicação clínica clara, pode ser considerada uma violação dos direitos humanos, nomeadamente o direito à integridade física, à autonomia corporal e à saúde sexual e reprodutiva da mulher. Muitas mulheres descrevem esta experiência como traumática, invasiva e, por vezes, como uma forma de violência.

Em Portugal, a mutilação genital feminina (MGF) é crime desde 2015 (artigo 144.º-A do Código Penal), enquadrando práticas que causem lesões no aparelho genital feminino por razões não médicas. Embora esta legislação tenha sido criada com foco em práticas culturais específicas, existe hoje um debate crescente sobre se a episiotomia de rotina, sem justificação clínica, poderá encaixar neste quadro legal, já que é uma intervenção invasiva, sem fundamento científico, e realizada frequentemente sem o consentimento da mulher.

Nova legislação sobre violência obstétrica em Portugal

Em 2025, foi aprovada em Portugal uma nova lei que reconhece formalmente a violência obstétrica como uma forma de violência institucional e de género. Esta lei protege as mulheres de práticas como a episiotomia sem consentimento, a manobra de Kristeller, o uso desnecessário de fórceps, e outras intervenções não fundamentadas na evidência. Estão previstas medidas de formação para profissionais de saúde, bem como mecanismos de denúncia e responsabilização.

A regulamentação da lei deverá entrar em vigor em 2026, representando um marco importante na humanização dos cuidados à gravidez e parto em Portugal.

O que dizem as evidências?

Estudos publicados em revistas médicas como a Cochrane Database of Systematic Reviewse a Acta Médica Portuguesa confirmam que:

   •  A episiotomia não reduz o risco de lacerações graves (grau III e IV).

   •  Não previne prolapso uterino nem protege o pavimento pélvico.

   •  Está associada a maior dor pós-parto, infeções e complicações a médio e longo prazo.

   •  A prática seletiva, com base na situação clínica individual, é mais segura e benéfica para as mulheres.

Conclusão

A episiotomia deve ser uma exceção, não a regra. Quando realizada sem necessidade médica ou consentimento da mulher, não é apenas uma má prática clínica — pode configurar uma forma de violência e de atentado à integridade física e psicológica da mulher.

As mulheres têm o direito de ser informadas, respeitadas e de participar ativamente nas decisões sobre o seu corpo e o seu parto. A mudança deste paradigma exige formação, coragem institucional e um verdadeiro compromisso com os direitos humanos no nascimento.

As informações mais atualizadas disponíveis nesses artigos são de 2021-2022. Especificamente:

  1. Um estudo de 2022 (Costa et al., 2022) relatou que a taxa de episiotomia em partos vaginais não instrumentais variava entre 31,8% no Norte e 59,8% no Centro de Portugal.
  2. Outro estudo de 2022 (Teixeira et al., 2022) mencionou que, entre 2000 e 2015, a taxa de episiotomia diminuiu de 55,7% para 13,3% em um hospital universitário.
  3. Um estudo de 2019 (García-Lorca et al., 2019) indicou uma taxa geral de episiotomia de 36,5% para todos os partos vaginais.

Para obter dados mais recentes, seria necessário consultar relatórios ou estudos publicados após 2022, que não estão incluídos nos artigos fornecidos. Recomendo verificar as estatísticas oficiais de saúde de Portugal ou publicações mais recentes de instituições de saúde portuguesas para obter informações atualizadas sobre as taxas de episiotomia.

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