As hormonas são mensageiras químicas: produzidas numa parte do corpo, viajam até outras áreas onde vão atuar. Durante a gravidez, o parto e o pós-parto, há uma intrincada dança hormonal entre mãe, bebé e placenta. Para que tudo decorra de forma segura e harmoniosa, estas hormonas precisam de estar presentes na quantidade certa, no momento certo.
Ao longo deste processo, as hormonas não só regulam as transformações físicas – como as contrações uterinas, a dilatação do colo do útero e a ejeção do leite – mas também influenciam intensamente o estado emocional e comportamental da mulher: fortalecem o vínculo mãe-bebé, modulam a perceção da dor e ativam comportamentos instintivos e protetores.
Infelizmente, na obstetrícia moderna, há uma tendência para valorizar excessivamente a tecnologia e os procedimentos médicos em detrimento da fisiologia natural do parto. Muitas vezes esquece-se que, para que esta cascata hormonal funcione plenamente, é essencial um ambiente que respeite a intimidade, a segurança, o silêncio e a autonomia da mulher.
Quando o trabalho de parto se inicia de forma espontânea e evolui sem interferências médicas desnecessárias, o corpo liberta este “cocktail hormonal” de forma mais eficaz, o que contribui para:
• Maior probabilidade de o bebé estar maduro para nascer;
• Evolução mais eficaz e menos dolorosa do trabalho de parto;
• Menor stress para mãe e bebé;
• Melhor adaptação ao pós-parto e início da amamentação.
Qualquer intervenção – como a administração precoce de analgesia epidural ou a restrição dos movimentos da mulher – pode interferir negativamente nesta cascata hormonal.
Vamos conhecer as principais hormonas envolvidas nesta jornada:
Ocitocina: a hormona do amor
Produzida no hipotálamo e libertada pela hipófise, a ocitocina é a hormona do afeto, da confiança e do vínculo. Está envolvida em todas as fases da vida sexual e reprodutiva – desde os orgasmos até ao nascimento e aleitamento.
Durante o parto, é libertada em pulsos, cada um deles provocando uma contração uterina. À medida que o bebé pressiona o colo do útero, essa pressão estimula ainda mais a produção de ocitocina e de prostaglandinas, que ajudam a amolecer e dilatar o colo.
Os níveis de ocitocina aumentam progressivamente ao longo do parto, atingindo o pico no período expulsivo e com a saída da placenta. Após o parto, mantém-se elevada, promovendo o vínculo imediato entre mãe e bebé e facilitando a subida do leite. A ocitocina é também responsável pelas contrações uterinas que reduzem o risco de hemorragia pós-parto e até ajuda a aquecer o bebé através da vasodilatação do tórax materno durante o contacto pele a pele.
É graças à ocitocina que a mãe sente prazer e tranquilidade ao cuidar do seu bebé. Esta hormona promove calma, ligação afetiva e comportamentos de proteção.
Beta-endorfinas: o analgésico natural
As endorfinas são opióides naturais, produzidos pela hipófise. São potentes analgésicos, muito mais fortes que a morfina, e têm efeitos de euforia, prazer e modulação da dor.
Durante o trabalho de parto, sempre que há um pico de ocitocina, há também um aumento de endorfinas. Juntas, estas hormonas criam um estado de consciência alterado, semelhante a um transe natural, que permite à mulher lidar com a intensidade do parto. Algumas mulheres tornam-se silenciosas, outras emitem sons primitivos ou guturais – todas estas expressões são normais e fisiológicas.
Mulheres que não recorrem a analgesia medicamentosa durante o parto tendem a manter níveis elevados de endorfinas. Estas também ajudam a ativar mecanismos de recompensa, contribuindo para a sensação de conquista e felicidade após o nascimento. Esta “paixão” sentida pela mãe em relação ao bebé – e muitas vezes também pelo companheiro – tem base neuroquímica.
O bebé, por sua vez, também produz as suas próprias endorfinas, que o ajudam a lidar com o stress do nascimento e a proteger o cérebro contra possíveis descidas temporárias de oxigénio. As endorfinas estão também presentes no colostro.
Adrenalina e Noradrenalina: energia e alerta
Produzidas pelas glândulas supra-renais, estas hormonas do stress ativam-se em situações de medo, dor ou insegurança. Em níveis elevados, podem inibir a libertação de ocitocina e atrasar o trabalho de parto.
Por isso, é fundamental garantir à mulher um ambiente tranquilo, seguro e acolhedor. Contudo, estas hormonas têm um papel importante no período expulsivo: nesse momento, os seus níveis aumentam naturalmente, ativando o reflexo de ejeção do bebé e colocando mãe e bebé num estado de alerta ativo e vigilante.
No bebé, estas hormonas ajudam na transição para a vida extrauterina: promovem a respiração, limpam os pulmões, mantêm o cérebro bem oxigenado e regulam a temperatura corporal.
Após o parto, o contacto pele a pele ajuda a reduzir os níveis de adrenalina e a aumentar novamente a ocitocina.
Prolactina: a hormona da maternidade
Produzida pela hipófise, é a principal responsável pela produção de leite materno. Além disso, promove comportamentos de cuidado, aconchego e vínculo com o bebé, reduz o stress e estimula o instinto protetor.
A prolactina tem um papel importante no pós-parto imediato e ajuda o bebé a adaptar-se ao novo ambiente fora do útero. Os seus níveis aumentam durante a amamentação e reforçam o vínculo entre mãe e filho.
Prostaglandinas
São substâncias semelhantes a hormonas que ajudam a preparar o colo do útero e a pelve materna para o início do parto. Atuam também na redução dos níveis de progesterona, permitindo o início das contrações.
Progesterona
É a hormona que mantém a gravidez. Impede as contrações uterinas precoces, protegendo o bebé enquanto se desenvolve. No final da gravidez, os seus níveis diminuem para dar lugar às hormonas do parto.
Cortisol e Hormona Libertadora de Corticotrofina (CRH)
Estas hormonas do stress desempenham um papel fundamental no final da gravidez. Estimulam a produção de estriol, aumentam os recetores de ocitocina e promovem a libertação de prostaglandinas. Tudo isto contribui para iniciar e manter o trabalho de parto.
Estriol
É um estrogénio produzido pela placenta, que ajuda a inibir a ação da progesterona e a preparar os músculos do útero para as contrações. Poucos dias antes do parto, há um aumento significativo do estriol, o que também favorece a preparação das glândulas mamárias para a amamentação.
Relaxina
Produzida pela placenta e pelos ovários, esta hormona relaxa os ligamentos e articulações da pelve, facilitando a passagem do bebé. Também contribui para o crescimento e distensão do útero. A sua ação é mais intensa no final da gravidez.
Em resumo, o trabalho de parto é muito mais do que um conjunto de contrações: é um processo profundamente hormonal, fisiológico e instintivo. Quando respeitamos o tempo e o corpo da mulher, promovemos um parto mais seguro, positivo e transformador – para a mãe, o bebé e toda a família.