Hormonas são, por definição, substâncias produzidas num local do organismo, mas que vão atuar noutro local distante portanto, têm que “viajar até ao seu local de trabalho”.
Toda a evolução da gravidez, parto e pós-parto está na dependência de uma complexa interação entre várias hormonas produzidas pela mãe, bebé e placenta. Elas precisam estar na quantidade certa, na hora certa para que o processo decorra de maneira perfeita.
Em todo o mecanismo do trabalho de parto, as hormonas são responsáveis não só pelas alterações físicas (contrações uterinas, dilatação do colo, ejeção do leite…) como pelas alterações emocionais e comportamentais da mulher (vínculo mãe/bebé, alívio da dor, comportamento primata de algumas mulheres…).
Na obstetrícia moderna existe um deslumbramento muito grande com as tecnologias que acaba por negligenciar toda a fisiologia do parto, toda a capacidade inata que o corpo da mulher tem de parir. Existe ainda uma enorme falta de conhecimento sobre a necessidade de promover um ambiente facilitador com privacidade, segurança e silêncio para que mãe e bebé interajam e o milagre da vida aconteça de forma natural, como tem acontecido desde há muitos milhares de anos na raça humana.
Quando o trabalho de parto se inicia de maneira espontânea e evolui sem interferências externas, as hormonas vão atuar de maneira plena. As vantagens de esperar que este processo aconteça naturalmente são: (1) a certeza de que neste momento o bebé está maduro, (2) uma evolução mais efetiva do trabalho de parto, (3) diminuição da dor e do stress e (4) melhor adaptação da mulher e do bebê após o parto, aumentando as hipótese de um aleitamento bem sucedido e melhorando o vínculo entre mãe e bebé. Portanto, só conseguimos observar e constatar todas estas alterações, principalmente as comportamentais, se não produzirmos interferência no processo; p. ex. ao abolirmos a dor com uma epidural, ou ao impedirmos a mulher de se movimentar livremente, toda a cascata da produção hormonal será afetada.
Cada hormona tem a sua função própria, mas também ajuda na atuação de outras hormonas para que tudo aconteça de maneira perfeita. Eles atuam preparando o corpo da mulher para a gravidez, parto e recuperação pós-parto, para crescimento e desenvolvimento do bebé e para o fortalecimento do vínculo entre a mãe e o bebé após o parto.
No cocktail de hormonas da gravidez e parto, sobressaem as seguintes hormonas:
- Ocitocina
- Prolactina
- Adrenalina
- Noradrenalina
- Prostaglandina
- Relaxina
- Endorfinas
- Outros – progesterona, cortisol, hormona libertadora de corticotrofina, estriol
Ocitocina
Também conhecida como hormona do amor, do afeto, das emoções, do altruísmo, … é produzida numa área do cérebro primitiva e comum aos mamíferos – o hipotálamo – e é armazenada na hipófise. Vai atuar no sistema límbico que está relacionado às emoções e em outros locais do organismo.
Quando o bebé está pronto para nascer, ocorre um aumento progressivo na libertação de ocitocina em pulsos na corrente sanguínea. Cada impulso gera uma contração uterina. Essas contrações vão fazer com que a cabeça do bebé (ou o rabo) faça pressão no colo do útero que é capaz de desencadear um estímulo central (no cérebro) para aumentar a produção de mais ocitocina e um estímulo local para aumentar a produção de prostaglandina que também vai participar no amolecimento e dilatação do colo uterino.
Ao longo do trabalho de parto, os níveis de ocitocina vão aumentando cada vez mais de modo que as contrações uterinas vão se tornando cada vez mais fortes e frequentes. Os níveis de ocitocina são máximos no período expulsivo (a ocitocina está diretamente ligada ao reflexo de empurrar o bebé para nascer – puxos) e atinge um pico com a expulsão da placenta.
Durante todo o trabalho de parto, tanto a mãe quanto o bebé são inundados com uma enorme quantidade de ocitocina que permanece a circular após o parto fazendo com que eles se apaixonem um pelo outro após o primeiro contacto. Grandes quantidades desta hormona promove o forte vínculo que garante o cuidado e a proteção da mãe para com o seu bebé estimulando o prazer no cuidar e facilitando o aleitamento. Esta ligação vai durar a vida inteira.
A ocitocina tem também efeitos calmantes e analgésicos. Ela reduz o medo e promove calma, a conexão, o crescimento e a sociabilidade.
Atua ainda nas células do cérebro do bebé deixando-o num estado mais adormecido numa tentativa de diminuir o seu desconforto durante o trabalho de parto.
Após o parto ela é responsável pela manutenção da contração uterina eficaz para diminuir o risco de hemorragia e por uma vasodilatação do tórax materno que proporciona um aquecimento natural do bebé.
Também é responsável pela facilitação da ejeção do leite ao promover a contração das fibras musculares que estão ao redor das glândulas mamárias.
A ocitocina está presente em todos os aspetos da sexualidade humana: na relação sexual, tanto o homem quanto a mulher libertam ocitocina o que ajuda a produzir sentimentos de afeição e vínculo.
Beta-endorfinas
São os opióides endógenos (naturais), semelhantes à morfina (mas que chegam a ser mais potentes que a mesma) e que também estão armazenados na glândula hipófise.
As endorfinas regulam o humor e são também calmantes naturais. Ajudam a aliviar a dor e são responsáveis pelo estado de consciência alterado da mulher durante o trabalho de parto podendo levar à euforia e à expansão da consciência, inclusive proporcionar orgasmos durante o trabalho de parto. Fazem com que a mulher sinta mais prazer do que dor.
Os níveis de endorfinas aumentam muito durante o trabalho de parto: sempre que acontece uma descarga de ocitocina, há também uma de endorfinas. Este aumento combinado destas duas hormonas, promoverá um alívio natural da dor e induzirá um estado de consciência alterado, tipo “transe natural”. Às vezes as mulheres recolhem-se ao silêncio, mas outras vezes elas emitem sons tais como gemidos ou sons mais primitivos.
Nas mulheres que não usam medicação para a dor durante o parto, o nível de endorfinas continua a aumentar de forma constante e acentuada – ao contrário, parece que existe uma diminuição importante nos níveis de endorfinas com o uso de medicação para a dor.
As endorfinas participam também na ativação de mecanismo de compensação que vão promover um estado de satisfação e recompensa devido a experiência do parto. A mãe vive uma euforia tal que sustenta o seu estado de paixão não só pelo bebé, mas também pelo pai presente, responsável também por aquele bebé que ela tem agora nos braços.
Neste período pós-parto precoce, as endorfinas são também responsáveis no fortalecimento da relação mãe/bebé. Uma queda nos níveis de endorfina neste momento pode contribuir para o “baby blues”, ou depressão pós-parto.
Este aumento das endorfinas é compartilhado entre o corpo da mãe e do bebé sendo que o bebé também liberta as suas próprias endorfinas durante o trabalho de parto e parto. Parece que as endorfinas exercem ainda um efeito protetor no cérebro fetal para deficiências de oxigênio aumentando de uma certa forma a resistência das células cerebrais a baixos níveis de oxigénio, alem de oferecer suporte ao bebé na transição e stress pós-parto, pois as beta-endorfinas estão presentes no colostro.
Adrenalina e Noradrenalina
Conhecida como a hormona de “lutar ou fugir” devido a suas altas concentrações nos momentos de grande stress, são produzidas pela glândula suprarrenal (localizada no polo superior dos rins).
A sua libertação pode provocar boca seca, taquicardia, dilatação das pupilas, sensação de pânico, sudorese fria nas mãos, náuseas.
As mulheres que se sentem ameaçadas durante o trabalho de parto (p. ex. medo ou dor) podem produzir altos níveis de adrenalina que vai diminuir os níveis de ocitocina. A adrenalina pode portanto, retardar o parto e até pará-lo completamente. Assim, um ambiente de segurança e conforto é condição essencial para a normal progressão do trabalho de parto. Mas, no período expulsivo, a adrenalina é bem-vinda e é quando as suas concentrações atingem o máximo e participa no reflexo de ejeção do bebé.
Induz a um estado de alerta na mãe e no bebé que acabou de nascer.
É grande responsável pela adaptação crítica do recém-nascido à falta relativa de oxigenação, preservação do fluxo sanguíneo no coração e no cérebro, promoção da transição respiratória e limpeza dos fluidos pulmonares, promoção de energia metabólica para o período neonatal, controle de temperatura e manutenção de um estado de alerta no bebé.
O seu aumento faz com que a ocitocina diminua. O contato pele a pele quente e sem perturbação é importante para facilitar a queda materna e neonatal dos níveis dessa hormona, diminuindo o consumo de energia e aumentando a ocitocina que vai promover a contração do útero prevenindo a hemorragia.
Prolactina
Produzida na hipófise, é a hormona responsável pela produção do leite.
Conhecida como a “hormona da maternidade”, é promotora da sensação de carinho e instinto protetor. Além de aumentar o vínculo mãe/bebé, ela promove o sentimento de segurança e aconchego, redução do stress, da ansiedade e da tensão.
Antes do parto, ajuda na preparação do sistema respiratório do bebé.
Pode desempenhar um papel importante no desenvolvimento do trabalho de parto e ajudar o recém-nascido a adaptar-se à vida fora do útero
Atua em picos após o parto promovendo adaptação do bebé e o aleitamento.
Prostaglandinas
São substâncias similares a hormonas que atuam na preparação do colo do útero e da pelve materna para que o trabalho de parto se inicie.
São libertadas pelo útero quando este é estimulado pelo estrogénio e atuam diminuindo os níveis de progesterona
Progesterona
A progesterona é a hormona que mantém a gravidez, uma vez que ela impede que o útero se contraia enquanto o bebé ainda se está a desenvolver. No fim da gravidez, quando o bebé já está maduro, ocorre um aumento do estriol que vai inibir a progesterona e o trabalho de parto já poderá iniciar.
Cortisol e Hormona Libertadora de Corticotropina
São hormonas do stress, libertados quando a gravidez está a chegar ao final. Eles provocam o aumento da produção do estriol, que vai atuar inibindo a ação da progesterona.
O cortisol também ajuda na evolução do trabalho de parto, ao aumentar a libertação de prostaglandinas. Também promove contrações, aumentando os efeitos da ocitocina.
Estriol
Inibe a síntese de progesterona pela placenta, prepara os músculos do útero para o parto. Alguns dias antes do parto, ocorre uma descarga importante desta hormona que vai fazer com que aumente a quantidade de recetores de ocitocina no útero e na mama.
Relaxina
Produzida pela placenta e pelos ovários, a relaxina promove o relaxamento, o amolecimento das articulações e ligamentos pélvicos permitindo um aumento na amplitude da pelve.
Ela também é a responsável pela distensão do útero à medida que o bebé cresce.
A sua maior produção ocorre no final da gravidez.